A Doença de Graves é a causa mais comum de hipertireoidismo no mundo e afeta principalmente mulheres entre 20 e 50 anos. Trata-se de uma condição autoimune, na qual o sistema imunológico produz anticorpos que estimulam excessivamente a tireoide, levando à produção elevada de hormônios T3 e T4. Quando não diagnosticada e tratada corretamente, pode gerar alterações cardíacas, oculares, metabólicas e até risco de crise tireotóxica, uma emergência médica.
Neste guia completo, vou te explicar de forma clara, o que é a Doença de Graves, seus sintomas, exames essenciais, diagnóstico, fatores de risco e como diferenciar de outras condições, como a tireoidite de Hashimoto. O conteúdo foi elaborado com rigor clínico e linguagem acessível, para orientar tanto pacientes quanto profissionais de saúde.
O que é a Doença de Graves?
A Doença de Graves é uma enfermidade autoimune caracterizada pela presença dos anticorpos TRAb (anticorpos anti-receptor de TSH), que estimulam continuamente a glândula tireoide. Esse estímulo exagerado leva ao aumento do volume da glândula e à produção excessiva de hormônios tireoidianos, causando um quadro de tireoide acelerada.
O mecanismo da doença envolve predisposição genética associada a fatores ambientais, como estresse intenso, tabagismo e infecções. Em parte dos pacientes, a doença também afeta os olhos, gerando a oftalmopatia de Graves, um dos sinais clínicos mais marcantes.
Causas da Doença de Graves
Embora a causa exata não seja totalmente conhecida, existem fatores reconhecidos que aumentam o risco de desenvolver o quadro:
Autoimunidade e predisposição genética
Indivíduos com histórico familiar têm maior probabilidade de desenvolver hipertireoidismo autoimune. Alterações em genes relacionados à regulação imunológica podem favorecer a produção de anticorpos TRAb (Anti-Receptor do TSH).
Fatores ambientais
Fatores externos que podem desencadear ou piorar a condição:
Estresse físico ou emocional intenso
Infecções virais
Excesso de iodo na alimentação ou medicamentos
Pós-parto (período com maior instabilidade imunológica)
Tabagismo
O cigarro aumenta significativamente o risco de oftalmopatia de Graves e intensifica seus sintomas.
Sintomas da Doença de Graves
Os sintomas variam de pessoa para pessoa, mas estão geralmente associados ao metabolismo acelerado causado pelo excesso de hormônios tireoidianos.
Sintomas gerais e metabólicos
Perda de peso rápida, mesmo com apetite aumentado
Intolerância ao calor
Sudorese excessiva
Cansaço e fraqueza muscular
Tremores finos nas mãos
Aumento da frequência cardíaca (taquicardia)
Esses sinais refletem o estado de tireoide acelerada, característico do hipertireoidismo.
Sintomas emocionais e neurológicos
Ansiedade
Irritabilidade
Insônia
Agitação psicomotora
A relação entre tireoide e sistema nervoso central faz com que alterações hormonais impactem diretamente o humor e o comportamento.
Sintomas oculares (Oftalmopatia de Graves)
Em cerca de 25–50% dos pacientes, os anticorpos também atacam tecidos ao redor dos olhos:
Olhos saltados (exoftalmia)
Sensação de areia nos olhos
Edema palpebral
Visão dupla
Fotofobia
A oftalmopatia de Graves pode ocorrer antes, durante ou após o diagnóstico da doença.
Sinais na tireoide (bócio difuso)
Em muitos casos, há aumento visível e palpável da glândula tireoide, formando o bócio difuso, um achado frequente no exame físico.
Como é Feito o Diagnóstico da Doença de Graves
O diagnóstico é clínico e laboratorial, combinando sintomas típicos com alterações em exames de sangue e imagem.
Exames de sangue essenciais
A avaliação hormonal é o primeiro passo:
TSH: geralmente suprimido (muito baixo)
TRAb: positivo confirma Doença de Graves
O anticorpo TRAb positivo é altamente específico e permite diferenciar Graves de outras causas de hipertireoidismo.
Exames complementares
Outros testes podem ser necessários em casos específicos:
Ultrassom de tireoide: avalia a dimensão da glândula e padrão de vascularização
Cintilografia da tireoide: útil para diferenciar Graves de tireoidites
Ecografia orbital: nos casos de oftalmopatia moderada ou grave
Diagnóstico diferencial
É importante diferenciar a Doença de Graves de outras condições:
Tireoidite de Hashimoto em fase inicial (Hashitoxicosis)
Tireoidite subaguda
Nódulos hiperfuncionantes
Hipertireoidismo induzido por medicamentos ou iodo
A presença de TRAb positivo e bócio difuso facilitam a distinção.
Principais Complicações da Doença de Graves
Sem tratamento adequado, a doença pode causar:
Complicações cardíacas
Arritmias
Fibrilação atrial
Insuficiência cardíaca em casos avançados
Crise tireotóxica
Condição rara, mas potencialmente fatal, marcada por febre alta, confusão mental e descompensação cardiovascular. Exige atendimento imediato.
Complicações oculares
A oftalmopatia de Graves pode evoluir para:
Exposição da córnea
Ulcerações
Perda parcial da visão
Doença de Graves na Gravidez
A gestação exige atenção especial, pois os hormônios tireoidianos são essenciais para o desenvolvimento do feto. O excesso de hormônio ou o uso inadequado de medicamentos pode causar complicações como pré-eclâmpsia, prematuridade e baixo peso ao nascer.
A dosagem de TRAb é particularmente importante, pois anticorpos elevados podem afetar o bebê.
Como Diferenciar Doença de Graves e Hashimoto
Apesar de ambas serem doenças autoimunes da tireoide, elas se manifestam de forma diferente:
Doença de Graves
TRAb positivo
Bócio difuso
Hipertireoidismo persistente
Hashimoto
Hipo ou hipertransitório (Hashitoxicosis)
Progressão para hipotireoidismo crônico
Tratamento da Doença de Graves
O tratamento depende da gravidade do quadro, idade, condição clínica e presença de oftalmopatia.
1. Medicamentos antitireoidianos
Os remédios mais utilizados são:
Metimazol (Tapazol®) — primeira escolha
Propiltiouracil (PTU) — preferido somente no 1º trimestre da gravidez
Eles reduzem a produção de hormônios pela tireoide e controlam os sintomas.
2. Iodo radioativo (I-131)
Indicado quando há recidiva após o uso de medicamentos ou contraindicação cirúrgica. Boa parte dos pacientes evolui para hipotireoidismo controlável com reposição de levotiroxina.
3. Cirurgia (Tireoidectomia)
Indicada em casos de:
Bócio volumoso
Recusa ou intolerância a medicamentos
Gravidez planejada a curto prazo
Suspeita de câncer associado
4. Tratamento da Oftalmopatia de Graves
Lubrificantes oculares
Corticoides
Radioterapia orbital
Cirurgia em casos graves
5. Estilo de vida e cuidados gerais
Evitar tabagismo
Reduzir fontes de estresse
Ajustar alimentação (controle de iodo)
Doença de Graves Tem Cura?
A doença tem controle e, em muitos casos, pode entrar em remissão completa após meses ou anos de tratamento adequado. A cura definitiva geralmente ocorre após a tireoidectomia total, mas isso significa dependência permanente de reposição hormonal, o que não impede vida normal.
Quando Procurar um Endocrinologista
Busque orientação médica se apresentar:
Perda de peso sem explicação
Taquicardia persistente
Tremores
Olhos saltados
Intolerância ao calor
O diagnóstico precoce evita complicações e melhora o prognóstico.
Conclusão
A Doença de Graves é a principal causa de hipertireoidismo e pode afetar diversos sistemas do corpo, incluindo coração, metabolismo e olhos. O reconhecimento precoce dos sintomas, aliado à realização dos exames corretos, especialmente TSH, T4 Livre e TRAb , é fundamental para um diagnóstico preciso e para prevenir complicações.
Com acompanhamento adequado e tratamento individualizado, a maioria dos pacientes alcança excelente controle clínico e qualidade de vida. Diante de qualquer sinal suspeito, a avaliação por um endocrinologista é essencial para orientar o melhor plano terapêutico.
Perguntas Frequentes
Sim. Mesmo após controle inicial com medicamentos, cerca de 30% a 50% dos pacientes podem apresentar recidiva e precisar de novas estratégias terapêuticas.
Os sintomas começam a melhorar entre 2 e 6 semanas após o início dos antitireoidianos, mas o controle completo dos hormônios pode levar alguns meses.
Não. A oftalmopatia de Graves ocorre em 25% a 50% dos casos. A gravidade varia e muitos pacientes apresentam apenas sintomas leves.
Sim, quando indicado corretamente. O iodo radioativo é seguro e utilizado há décadas, mas é contraindicado na gravidez e lactação.
Durante o hipertireoidismo, o mais comum é perder peso. Já após o tratamento, o metabolismo pode normalizar ou até reduzir, facilitando o ganho de peso.
Sim, embora seja menos comum. Nesses casos, o diagnóstico depende de outros exames, como ultrassom, cintilografia e avaliação clínica detalhada.
Pode. Alterações hormonais da gestação podem agravar o hipertireoidismo. Por isso, o controle rigoroso é essencial durante o pré-natal.
Não há uma dieta única, mas recomenda-se evitar excesso de iodo, reduzir alimentos estimulantes e manter ingestão adequada de cálcio e vitamina D.
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Lincoln Soledade, – Biomédico CRBM 41556/ES. Mestrando em Gestão em Saúde Pública. Especialista em Patologia Clínica e pós-graduado em Estética Avançada, atua desde 2018 na área de diagnóstico clínico hospitalar. Ao longo de sua trajetória, tem se dedicado à aplicação rigorosa do conhecimento científico para promover diagnósticos precisos, contribuindo significativamente para a qualidade do cuidado em saúde.

