O exame Coombs indireto, também chamado de teste de antiglobulina indireta (TAI) ou pesquisa de anticorpos irregulares (PAI), é um exame fundamental na imuno-hematologia clínica. Ele investiga se o paciente possui anticorpos livres no sangue capazes de reagir contra glóbulos vermelhos (hemácias), tendo impacto direto na segurança de transfusões sanguíneas, gestações e na avaliação de anemias hemolíticas.
Neste artigo, explico em detalhes como funciona o exame Coombs indireto, em quais situações ele é aplicado e como interpretar resultados positivos e negativos, sempre com base em evidências científicas e diretrizes internacionais.
O que é o exame Coombs Indireto?
O Coombs indireto é um exame de sangue que detecta aloanticorpos — anticorpos formados contra antígenos de hemácias diferentes daquelas do próprio organismo.
Esses anticorpos podem surgir após:
Gestação (mãe Rh negativo exposta a sangue do feto Rh positivo).
Transfusões de sangue prévias.
Sensibilização imunológica causada por transplantes ou outras exposições.
Ele difere do Coombs direto, que avalia anticorpos já aderidos às hemácias. O indireto pesquisa os anticorpos circulantes, funcionando como uma “avaliação preventiva” de risco imunológico.
Para que serve o exame Coombs Indireto?
O exame tem finalidade preventiva e diagnóstica em diversos cenários clínicos:
Gravidez e pré-natal: detectar sensibilização materna ao fator Rh, evitando a doença hemolítica do recém-nascido (DHRN).
Medicina transfusional: assegurar compatibilidade antes de uma transfusão de sangue, evitando reações hemolíticas graves.
Anemias hemolíticas: investigar causas imunológicas de destruição das hemácias (hemolise)
Monitoramento imunológico: acompanhar pacientes poli transfundidos ou com risco de desenvolver anticorpos.
Por ser um exame de triagem altamente sensível, ele é considerado obrigatório em protocolos de pré-natal e em bancos de sangue (AABB, 2020).
Diferença entre Coombs Direto e Indireto
Coombs Direto | Coombs Indireto |
---|---|
Anticorpos já ligados às hemácias do paciente. | Anticorpos livres circulando no soro. |
Diagnóstico de anemia hemolítica autoimune, reações transfusionais já instaladas. | Avaliação pré-transfusional, rastreamento pré-natal |
Se positivo, → hemácias do paciente já estão sensibilizadas | Se positivo → risco futuro de hemólise em transfusão ou gravidez |
Como é feito o exame Coombs Indireto?
O exame de coombs indireto segue um protocolo laboratorial padronizado:
Coleta de sangue venoso (não exige jejum).
Separação do soro do paciente.
Mistura do soro com hemácias-padrão, que apresentam antígenos conhecidos.
Adição do soro antiglobulina humana (reagente de Coombs — Anti-humano IgG).
Observação da reação: se houver aglutinação visível, o resultado é considerado positivo.
Na minha prática clínica, padronizo o uso de técnicas como gel-card ou microcoluna, pois elas aumentam a sensibilidade do exame e reduzem erros de interpretação.
Coombs Indireto na gravidez
O acompanhamento imunológico no pré-natal é uma das principais indicações do exame.
Gestantes Rh negativo (como “O-”, “A-”, “B-” ou “AB-”) devem realizar o teste no primeiro trimestre e repetir em diferentes momentos da gravidez.
Se o resultado for negativo, a paciente recebe a imunoglobulina anti-D (vacina anti-D) em momentos específicos para prevenir sensibilização.
Se o resultado for positivo, indica que a mãe já desenvolveu anticorpos anti-Rh. Nesses casos, o obstetra avalia o título de Coombs (quantidade de anticorpos), podendo recomendar ultrassonografia doppler, amniocentese ou até transfusão intrauterina.
Doença Hemolítica do Recém-Nascido (DHRN)
O Coombs indireto positivo pode indicar risco de eritroblastose fetal, condição onde os anticorpos maternos destroem as hemácias do bebê, levando a anemia grave, icterícia intensa e risco de morte fetal.
Atualmente, graças ao rastreio com o exame e à aplicação da anti-D profilática, a incidência da DHRN caiu drasticamente nos países que seguem protocolos de triagem (ACOG, 2021).
Resultado do exame Coombs Indireto
Resultado Negativo
Não foram detectados anticorpos irregulares.
Situação de baixo risco em transfusão e gestação.
Gestantes Rh negativo devem, ainda assim, receber profilaxia com imunoglobulina anti-D.
Resultado Positivo
Indica presença de aloanticorpos circulantes.
Em transfusões, exige pesquisa detalhada do anticorpo e escolha de sangue compatível.
Em gestantes, pode representar risco para o bebê.
Título de Coombs
Em gestantes com Coombs indireto positivo, o exame pode ser complementado pelo título de Coombs, que mede a concentração dos anticorpos.
Baixo título: risco reduzido, somente acompanhamento.
Título elevado: risco aumentado de anemia fetal, indicando monitoramento rigoroso.
Coombs Indireto no contexto transfusional
Em hemoterapia, o exame é parte do teste pré-transfusional, realizado antes da liberação de qualquer bolsa de sangue:
Negativo: transfusão pode seguir normalmente.
Positivo: exige provas cruzadas adicionais, identificação do anticorpo e seleção de sangue raro compatível.
Esse cuidado é vital para evitar reações hemolíticas transfusionais, que podem ser fatais.
Limitações e cuidados na interpretação
Apesar de altamente confiável, o exame possui limitações:
Resultados podem variar entre laboratórios devido à sensibilidade dos reagentes.
Um resultado negativo não exclui 100% o risco, já que alguns anticorpos podem estar abaixo do nível detectável.
Deve sempre ser interpretado em conjunto com a história clínica e exames complementares.
Considerações finais
O exame Coombs indireto é peça central na medicina transfusional e no pré-natal. Ele permite identificar riscos imunológicos que podem comprometer tanto o sucesso de transfusões quanto a saúde de gestantes e bebês.
Com base em protocolos internacionais (AABB, ACOG, Ministério da Saúde), o exame deve ser solicitado sempre em situações de risco. Entender os significados de resultado positivo ou negativo auxilia pacientes e profissionais de saúde a tomarem decisões mais seguras e eficazes.
Perguntas Frequentes
Sim, o exame pode ser realizado em crianças quando há suspeita de anemia hemolítica ou necessidade de transfusão compatível.
Geralmente, a cada trimestre, mas a frequência pode variar de acordo com o risco de sensibilização e orientação do obstetra.
Não necessariamente. O resultado positivo indica presença de anticorpos no momento, mas eles podem desaparecer com o tempo ou após intervenções profiláticas.
Não. Alguns anticorpos em níveis muito baixos ou raros podem não ser detectados. Por isso, a interpretação deve ser feita junto ao histórico clínico.
O exame é considerado seguro, pois é feito apenas com coleta de sangue venoso e não envolve radiação ou medicação.
Não. Embora seja essencial no acompanhamento de gestantes com fator Rh negativo, o exame também é utilizado em situações como transfusões sanguíneas e diagnóstico de anemia hemolítica autoimune.
O Coombs direto detecta anticorpos ou complemento já ligados às hemácias do paciente, enquanto o Coombs indireto identifica anticorpos livres no soro sanguíneo.
Não. O exame é realizado com uma amostra de sangue venoso e não exige jejum prévio.
O exame é altamente preciso, mas resultados falso-positivos ou falso-negativos podem ocorrer. A interpretação deve ser feita por profissionais de saúde especializados.
Um resultado positivo indica a presença de anticorpos que podem causar reações hemolíticas. O médico determinará a conduta adequada, que pode incluir monitoramento ou intervenções específicas.
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Lincoln Soledade, – Biomédico CRBM 41556/ES. Mestrando em Gestão em Saúde Pública. Especialista em Patologia Clínica e pós-graduado em Estética Avançada, atua desde 2018 na área de diagnóstico clínico hospitalar. Ao longo de sua trajetória, tem se dedicado à aplicação rigorosa do conhecimento científico para promover diagnósticos precisos, contribuindo significativamente para a qualidade do cuidado em saúde.